Comércio ameaça fauna coralina do Indo-Pacífico
Comércio ameaça fauna coralina do Indo-Pacífico
O aumento verificado ao longo dos últimos anos nas capturas de diversas espécies de peixes dos recifes de coral do Sudeste Asiático para fins alimentares tem sido particularmente preocupante e começa já a ameaçar seriamente as populações de escorpenas e bodiões. O alerta voltou a ser dado num relatório da Traffic, entidade que se tem desdobrado em esforços no sentido de convencer as autoridades locais a porem cobro ao que consideram ser uma «alarmante taxa de destruição dos stocks de peixe» na região.
Porém, além deste problema, existe ainda outra terrível ameaça que está a aniquilar irremediavelmente os frágeis recifes coralinos e que resulta directamente dos métodos destrutivos que são utilizados nesta pesca: para conseguirem capturar mais peixes vivos — que venderão depois a bom preço em determinados mercados da zona —, os pescadores estão a recorrer muito frequentemente à bombagem com cianeto. Ou seja, acabam por contaminar todo o ecossistema com um veneno que se espalha sem qualquer hipótese de controle e que permanece activo por bastante tempo.
Assim sendo, o relatório visa alertar as autoridades da região para a necessidade urgente de orientarem este comércio de uma forma que se afigure sustentável, travando a taxa alarmante de devastação das populações de peixe. Tanto mais que certas espécies que habitam os recifes de coral, como as escorpenas e os bodiões, são extremamente populares nos restaurantes chineses, onde os peixes são mortos à vista dos clientes e cozinhados na hora. A maior parte das remessas destes restaurantes é proveniente dos recifes de coral da Indonésia, das Filipinas e da Malásia.
Entre os mercados dominantes deste tipo de pescado contam-se Hong-Kong e o resto da China, bem como outras cidades onde existem grandes comunidades chinesas, como Singapura e Kuala Lumpur, na Malásia. Só em Singapura, por exemplo, estima-se que se faça por ano um consumo superior a 500 toneladas de peixes de recifes de coral capturados vivos. Intitulado «Fishing for Solutions: Can the Live Trade in Wild Groupers and Wrasses from Southeast Asia be Managed?», o estudo da Traffic investigou os quatro países do Sudeste Asiático mais envolvidos nesta indústria: Indonésia, Filipinas, Malásia e Singapura.
Década de 90 marcada por disparo nas capturas
O resultado? Foi nitidamente diagnosticada uma explosão nas exportações durante os primeiros anos da década de 90, que de paralelo só teve um proporcional decréscimo nos stocks de peixe naqueles mares. Em apenas seis anos, entre 1989 e 1995, as exportações de peixes vivos capturados nos mares do Sudeste Asiático cresceram das 400 toneladas para 5.000 toneladas, vindo, no entanto, a verificar-se também um declínio de 22% no ano seguinte. A Indonésia, que detém mais de 60% deste «bolo», viu as suas exportações caírem abaixo das 450 toneladas em 1996. Porquê? Pura e simplesmente porque a devastação de populações de peixe foi tão grande que nesse ano poucos havia para capturar.
A manifesta insuficiência das populações de peixes nas áreas tradicionais de pesca, como é o caso das Filipinas, por exemplo, forçou os comerciantes desta actividade a procurar mais e mais longe, no intuito de satisfazerem a procura crescente do mercado hoteleiro que, na sua maioria, é proveniente de Hong Kong. A consequência é a notória expansão deste tipo de pesca por todo o Sudeste Asiático. Tomemos como exemplo a situação da Indonésia: esta indústria provocou um empobrecimento bastante acentuado do ambiente aquático na região oriental do país e encontra-se agora em crescente movimento em direcção aos extensos recifes coralinos da parte oeste do arquipélago.
Mas também os restantes países seus vizinhos apresentaram uma diminuição semelhante nos stocks de peixes vivos que habitam os seus corais. Em 1996 as Filipinas viram as sua exportações reduzidas a metade, enquanto a Malásia — que ainda em 1993 consumia mais de 500 toneladas —, assistiu a um declínio para menos de 30%. De acordo com Simon Habel, director da Traffic, os métodos destrutivos aplicados para capturar os peixes dos recifes são igualmente problemáticos. Habel relata que, como a bombagem com cianeto é o método mais utilizado para recolher estes peixes, está a provocar danos inimagináveis nos ecossistemas dos recifes da região.
Este poderoso veneno é usado em grandes quantidades, com o objectivo de adormecer os peixes, para que a captura se torne mais fácil. No percurso até ao mercado, os peixes expelem todo o veneno, mas o perigo permanece ao nível do ecossistema que, sendo uma fonte de alimentação e criação para a pesca comercial, sofre deteriorações irreparáveis. No entanto, a Traffic ainda acredita que a indústria à volta dos peixes dos corais possa ser mantida de forma sustentável. Deste modo, poderiam conservar-se as populações piscícolas e assistir-se-ia a uma nova forma de desenvolvimento das comunidades costeiras do Sudeste Asiático.
Todavia — avisa a Traffic —, para que isto seja possível é necessário que a pesca de espécies de grande valor seja feita em quantidades relativamente pequenas. Assim, na opinião desta organização, a gestão desta indústria requer uma intervenção em todos os sectores da actividade e pode ser alcançada através da coordenação e assistência às escalas nacional e internacional. Estas políticas devem ser implementadas o mais brevemente possível, dada a gravidade do problema. A destruição das populações destes peixes no Sudeste Asiático está a expandir-se a uma velocidade muito acelerada e é urgente que se coloque a prioridade na limitação dos níveis de exploração.