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Continentes e conteúdos

Leia isto antes de escolher o aquário

O aquário deve adequar-se às necessidades dos seus habitantes

Antes de pensar nos conteúdos, há que avaliar muito bem como deverá ser o continente. Em aquariologia o aquário é o continente, claro está. E os conteúdos? Esses são muito mais do que a simples água com que iremos enchê-lo. Na verdade, são todos os elementos do habitat que queremos criar dentro dele e que deverão ajustar-se de uma forma o mais perfeita possível às exigências específicas de todos os seres que depois nele viverão, a começar pelos peixes, mas não deixando também de fora as plantas e os invertebrados.

 

Demasiado complicado? Nada disso. Chamar ao aquário continente é uma metáfora, é pensar seguindo uma lógica ecológica: é assim mesmo a ordem das coisas, tal como a podemos observar na Natureza. A Vida nasceu nos oceanos, é verdade, todos nós sabemos isso hoje. Mas mesmo muito antes de se formarem os rios e os lagos de água doce já tinham surgido os continentes; só depois disso, face às condições favoráveis que se encontravam nesses continentes e nos respectivos ambientes — climatéricas, geográficas, etc — é que começaram a surgir as espécies de animais e de plantas que vivem nesses corpos de água.

 

Em Ecologia, essas variáveis chamam-se os factores abióticos (como a luz, a radiação, a temperatura, o vento, a água, a composição do solo, a pressão, etc). Foram todos esses factores abióticos, esses factores de suporte à Vida, que determinaram que os ambientes evoluíssem assim, que determinaram a variação dos habitats e que proporcionaram a biodiversidade. Porque, tal como nos oceanos o principal factor limitativo para a distribuição das espécies é a temperatura (sendo que todos sabemos que esta última varia com a latitude, a profundidade, etc), os continentes estão intrinsecamente ligados à distribuição geográfica de todas as espécies, foram determinantes para a vida nos ambientes aquáticos de água doce.

 

A Natureza como fonte de inspiração

 

Como decerto já percebeu, caro leitor, a ideia desta introdução é apenas pô-lo a pensar no seu aquário com base naquilo que pode ver na Natureza. O seu aquário será um ambiente fechado que irá servir de suporte à vida dos respectivos habitantes. De uma coisa podemos ter a certeza: todos os elementos que viermos a colocar dentro do nosso pequeno ecossistema (sejam eles a areia, os seixos, as rochas, os troncos, etc) vão ter, mais tarde ou mais cedo, uma influência directa no meio ambiente e por consequência nos seres vivos, seja por via de aspectos físicos, químicos ou mesmo biológicos. Na verdade, ao seguirmos esta lógica — a de prestarmos uma particular atenção a todos os factores abióticos — estaremos também a assegurar, ao mesmo tempo, as condições essenciais para que o novo aquário nos venha depois a dar muito menos problemas.

 

É claro que as espécies, tanto animais como vegetais, também têm a capacidade de se adaptarem, de se aclimatarem, e até de se desenvolverem em condições adversas. Só que isso verifica-se aos poucos e poucos, muito devagar. É um processo que não se pode apressar, que demora milénios. Não se recria. Os peixes e as plantas — tenham eles sido capturados nos habitats de origem ou criados em cativeiro —, terão de encontrar no aquário condições que lhes proporcionem uma existência saudável e vigorosa. E isso não se resume a terem condições para as suas funções vitais, para sobreviverem. É muito mais do que isso: o seu bem-estar depende de muito mais factores, como iremos mais à frente ver.

 

Assim, antes de escolhermos um aquário, devemos pensar bem numa série de pontos essenciais para conseguirmos proporcionar aos seus futuros inquilinos as condições para uma vida cómoda e tranquila (e para nós também, evitando-nos problemas). E essa análise deve começar, desde logo, por analisarmos o espaço de que dispomos para instalar o tanque e o sítio onde ele irá ficar. Porque um aquário biologicamente equilibrado, que é o objectivo de qualquer aquariófilo consciencioso, pode manter-se no mesmo local por muitos anos. Serão por isso esses dois aspectos os elementos decisivos para que possamos pensar como irá ser o nosso continente.

 

Mais pesado do que parece

 

Pelo menos na maioria das casas, o espaço disponível para um aquário costuma logo representar uma forte limitação à escolha do tipo de tanque. Isto porque, quando se equacionam as dimensões, há que se ter também em conta o peso total que o aquário irá ter depois de cheio. Adicionando ao peso da água o peso do areão, o das rochas, o dos troncos, etc, o que se constata é que um tanque com capacidade para 120 litros acaba por pesar muito mais do que os cerca de 120 quilos inicialmente previstos.

 

Ou seja, será que o chão do local da casa onde está a pensar colocar o novo aquário é suficientemente resistente para aguentar todo esse peso? Não se esqueça também, para estas contas, do peso do móvel ou da estrutura em que ele estará assente. É que convém instalar qualquer aquário a uma altura ao nível dos olhos e num local que nos permita observá-lo confortavelmente. E já agora, se optar por um móveld e madeira, não se esqueça igualmente de proteger o tampo contra os inevitáveis pingos de água (vêm com o pacote, o nosso hobby é assim). Todavia, se estiver a pensar num aquário com mais de 300 litros, talvez seja melhor equacionar uma estrutura de ferro para lhe servir de suporte, pois pode compensar a longo prazo.

 

  Nota: O valor de referência em Portugal relativamente ao peso máximo suportado pela placa em prédios residenciais é de 2,0 kN/m2, o que equivale sensivelmente a 204 Kg/m2. Todavia, as placas de betão dos prédios modernos, construídos após a década de 70, suportam no mínimo duas vezes esse valor. Embora num aquário a carga/força seja exercida de forma permanente, o peso total acaba por ser distribuído e suportado pela placa toda. Uma estante cheia de livros, só para dar um exemplo, pesa bem mais do que um aquário de 500 litros cheio de água e o seu peso não está tão uniformemente distribuído.

 

Feitas estas contas, não é preciso ser barra em aritmética para concluir que o peso total do conjunto para um aquário médio pode atingir valores muito significativos. Portanto, se eventualmente já estava a pensar adquirir um aquário com capacidade para 500 ou 600 litros, pense duas vezes. E se morar num apartamento ponha-o sempre num sítio junto a uma viga estrutural do prédio. Mas há outra coisa de que também pode estar certo: em termos relativos, dará muito menos trabalho manter em boas condições um tanque de grandes dimensões, na casa dos 600 ou 800 litros, do que um que não ultrapasse os 60 ou 80 litros.

 

Além disto, se por acaso for um dos privilegiados que dispõem de espaço propício para instalarem um tanque com capacidade para várias centenas de litros e estiver mesmo decidido a fazê-lo, não esqueça de verificar se existe alguma forma de ligar facilmente uma torneira perto dele, para o encher. E se também haverá, ao invés, maneira de o esvaziar facilmente, já a pensar nas mudanças de água que terá de fazer.

 

Os perigos das correntes de ar

 

Finalmente, existem dois outros pontos muito importantes a ter em consideração nesta análise prévia à escolha do aquário. Um deles prende-se com o facto de o local escolhido para um tanque tropical não dever situar-se nunca numa zona propícia a correntes de ar ou a fluuações térmicas, pois os futuros habitantes podem ressentir-se muito com isso. Aliás, este é um aspecto que não deve ser nunca menosprezado, pois as oscilações repentinas na temperatura assumem-se frequentemente como causa de surtos de doenças aparentemente inexplicáveis em tanques tropicais.

 

O segundo ponto tem a ver com a exposição directa do tanque à luz solar. Se não a puder controlar eficazmente, evite-a. De facto, até talvez seja preferível pôr o aquário num recanto sombrio, onde ele possa ser um elemento de iluminação desse espaço com a sua luz artificial, pois qualquer aquariófilo experiente sabe que os excessos de luz solar acabam por afectar passado pouco tempo o equilíbrio de um novo aquário: favorecem o rápido aparecimento de algas nocivas, que se multiplicam a uma velocidade estonteante.

 

Quando essas algas começam a disparar, por beneficiarem do excesso de luminosidade, é preciso muito pouco para adquirirem num ápice um estatuto de praga, passando então a competir com as plantas numa luta desigual. Assim, excepto se estiver a pensar fazer criação de algumas espécies de peixes em concreto, para as quais os primeiros raios de sol da manhã podem funcionar como factor estimulador da desova, o melhor será evitar totalmente a exposição directa do seu tanque à luz do dia.

 

E pronto. Feita esta análise prévia, pode então começar a fazer uma ideia do tipo de aquário que pretende adquirir. Agora já está em condições de saber o local onde o quer colocar e também terá certamente uma ideia das dimensões máximas que o novo tanque poderá ter. Ou seja, já se encontra em condições para formar uma ideia de qual será o tamanho do tanque, algo imprescindível para planear o tipo de peixes e de plantas que poderá pôr lá dentro. Por outro lado, tenha em atenção que é hoje consensual que as formas ideais para os aquários são em paralelepípedo recto ou em cubo. Os aquários redondos, do tipo globo de vidro, além do seu uso para manter peixes estar hoje proibido, não reúnem boas condições para criar um sistema biologicamente equilibrado, algo absolutamente essencial para o bem-estar dos seres vivos a nosso cargo. É disso tudo que lhe vamos falar nos próximos artigos.